A Inteligência Artificial e o processo de programação
Introdução
Em poucos anos, percebe-se que a Inteligência Artificial atingiu proporções incríveis, e o acesso a essa tecnologia tem se tornado cada vez mais fácil e abrangente. Muitos programadores, profissionais ou pessoas de várias áreas do conhecimento usam ela para auxiliar em tarefas diárias, na conclusão de afazeres e para aprender algo novo. Mas, até onde a presença da IA ainda é um auxílio, e quando ela deixa de ser um assistente e passa a assumir todo o trabalho? Como evitar isso?
A maneira que a IA é usada impacta diretamente no nosso cérebro
O nosso sistema nervoso é extremamente complexo quando comparado ao mesmo sistema de outros seres vivos. Mas, apesar de sua estrutura elaborada, percebe-se que ele possui fragilidades que impactam nas nossas rotinas do dia a dia, como a perda de memória causada pelo uso excessivo de telas e redes sociais. Esse problema, somado a métodos de estudos errôneos e ineficientes, resultam numa captação mínima do aprendizado. Em outras palavras, não importa quantas horas sejam estudadas, os resultados chegam muito longe do esperado.
De acordo com um estudo publicado na revista Temas em Saúde, a quantidade de informação que a tecnologia entrega "[...] parece reduzir os recursos cognitivos necessários para o processamento profundo de informação, [...] que pode interromper o desenvolvimento de habilidades de leitura profunda e diminuir a consolidação da memória" (pág. 10). O estudo indica também que, quando há a consciência de que existe uma tecnologia capaz de prover informação rápida e correta, não há preocupação nenhuma em memorizar as coisas, já que a informação será facilmente recuperável, Esse efeito é válido para a IA e outros meios de acesso à informação (navegadores, sites, blogs, etc.)
Relação desse problema com a programação
Na programação, existem vários padrões a serem seguidos a depender da linguagem, e muitas vezes eles se tornam repetitivos ou confusos. Para facilitar esse processo, foram criados os Copilots: assistentes que funcionam à base de IA e completam seu código de acordo com as edições feitas nele - sendo um dos exemplos mais famosos o GitHub Copilot. Na teoria, conforme você escreve seu código, a IA completa automaticamente, de acordo com o que você escreveu, no intuito de encurtar o processo e facilitá-lo.
Mas na prática, isso pode ser prejudicial para o aprendizado de uma linguagem, principalmente quando se trata de alguém que está dando seus primeiros passos na programação. Ver como a IA completa seu código rapidamente pode fazer com que o código apresente erros, já que a ferramenta pode fazer ações erradas, ou fazer tudo corretamente, e em ambos os casos, o programador não entende o que aconteceu, nem como, tampouco o que deve ser feito em seguida.
O problema também se aplica a desenvolvedores de diferentes níveis, e sai da bolha dos Copilots: muitos programadores usam outras IAs como ferramenta de pesquisa e dão a elas o comando para desenvolver o código inteiramente. Isso prejudica o processo de desenvolvimento, principalmente quando o usuário não possui domínio da linguagem usada, pois também pode trazer problemas ao seu código que ele não será capaz de entender.
Aprender passivamente (assistindo videoaulas, lendo livros, ou nesse caso, permitindo que a IA faça o código pelo usuário) não auxilia no processo de aprendizagem, pois é um método que permite que o conteúdo seja visto, mas não efetivamente aprendido. Seu cérebro precisa associar a nova informação captada a alguma situação ou experiência, o que torna a memória "mais forte" e ajuda a fixar o conhecimento.
E como resolver?
A solução para o mau uso das tecnologias no processo de desenvolvimento de softwares e aprendizado de programação é simples. Continuar usando as tecnologias, mas de um jeito diferente. Recomenda-se que, além de aprender a teoria, aprenda-se ativamente (fazendo exercícios, buscar entender a explicação para certas coisas, ou ainda testar coisas sem consulta), pois assim há maior retenção do novo assunto. Um estudo da pesquisadora Cynthia J. Brame, da Universidade de Vanderbilt, mostra que os estudantes que aprendem passivamente têm cerca de 35% de chance de reprovarem em uma matéria, enquanto os usuários de métodos ativos têm pouco mais de 20% de chance de reprovarem.
As principais dicas são:
- Não seja tão direto nas suas dúvidas. Caso use IAs como o ChatGPT ou DeepSeek, não pesquise como fazer todo o processo que você quer. Quebre ele em partes menores e pesquise a partir delas. Ou seja, ao invés de pesquisar "Como criar uma calculadora em C#", desmembre esse processo e comece com "Como criar uma função em C#", por exemplo. Isso ajuda a compreender melhor o que você está fazendo.
- Abra mão do auxílio, quando der. Desative os Copilots, a não ser que você tenha domínio total da tarefa. Quando for fazer algo, evite usar as sugestões do Copilot e passe a pensar por conta própria. Dessa forma, você estará aplicando o método ativo de estudo.
- Pense. Boa parte do aprendizado vem quando persiste-se em uma dúvida e, depois de um tempo, percebe-se um detalhe que não foi visto antes e isso resolve o questionamento. Antes de partir para pesquisas, experimente fazer por conta própria, errar é uma peça-chave o aprendizado ativo.
Conclusão
Em síntese, é possível ver que, apesar das IAs terem o propósito de facilitar o processo de programação, muitas vezes elas são usadas de maneira errada, e isso prejudica a aprendizagem e pode trazer problemas futuros, já que o mercado de trabalho na área exige que você pense por si, então sem sempre poderá contar com o apoio de pesquisas. Entretanto, revisando seus métodos de estudo e revisitando a maneira de desenvolvimento, é possível usar a tecnologia a seu favor, conciliando aprendizado e inovação no desenvolvimento de softwares.
Link do estudos mencionados:
Temas em Saúde: https://temasemsaude.com/wp-content/uploads/2018/12/18412.pdf