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Fernando Araujo
Fernando Araujo08/04/2024 10:13
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<Direto ao Ponto 25> Visionários da Computação – Do transistor ao microprocessador

  • #Informática Básica


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Olá, dev!

  

Este é mais um artigo da série DIRETO AO PONTO, que eu estou escrevendo para a DIO. Ele vai tratar de pessoas relevantes para a área da Computação, principalmente aqueles que inventaram componentes eletrônicos, como transistores, circuitos integrados e os microprocessadores.

 

Sumário

1.  Introdução

2.  Os inovadores da eletrônica

3.  Considerações finais

4.  Referências

 

1 – Introdução

 

A série DIRETO AO PONTO enfoca artigos sobre conhecimentos básicos da programação e é voltada, principalmente, para os iniciantes.

 

Este novo artigo vai tratar de pessoas e ideias que levaram o hardware a outro nível, deixando para trás as válvulas eletrônicas e criando dispositivos como os transistores, circuitos integrados e os microprocessadores.

 

Será mostrado quem era cada um deles, qual foi a sua inovação (ou inovações) e com quais inovadores teve contato ou se utilizou de suas ideias para criar sua própria inovação.

 

O foco maior será nas pessoas, não nos produtos.

  

 

2 – Os inovadores da eletrônica

 

 Shockley, Bardeen e Brattain


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Fig. 1 – Shockley (esquerda), Bardeen (centro) e Brattain (direita).

 

Eles eram americanos e trabalhavam nos Laboratórios Bell, na equipe de estado sólido. William Shockley era físico e inventor, John Bardeen era engenheiro, físico e professor, Walter Houser Brattain era físico.

 

Shockley tinha a convicção que poderia substituir as válvulas eletrônicas por semicondutores sólidos, usando o germânio. Líder da equipe e supervisor (embora preferisse participar ativamente das pesquisas), Shockley era o teórico e John Bardeen era o prático, que sempre tinha insights decisivos para os projetos.

 

Bardeen percebeu que os elétrons ficavam presos na superfície do semicondutor, formando uma barreira que permitia controlar a corrente elétrica. Ele chamou esta estrutura de "junção" e ela possibilitou uma leve amplificação da corrente elétrica, criando o que conhecemos como transistor.

 

Shockley achou o método descoberto por Bardeen muito inseguro, feito às pressas, e achava que poderia fazer algo melhor. Além disso, ele também queria contribuir com alguma invenção própria ao projeto do transistor.

 

Ao invés de usar pontos de ouro numa placa de germânio, ele imaginou a “junção” como um sanduíche, com duas camadas de germânio, impregnado por  impurezas, uma superior e outra inferior. Entre elas, haveria uma fina lâmina de germânio com buracos.

 

Esta camada do meio funcionaria como uma barreira ajustável que regularia a corrente de elétrons que fluía entre as camadas superior e inferior, amplificando ou interrompendo, instantaneamente, a corrente que passava pelo semicondutor.

 

Shockley escondeu esta ideia da equipe, mas quando ele viu que os outros colegas estavam chegando perto de descobrir essa junção sanduíche, acabou contando sua ideia à toda a equipe.

 

Finalmente, o projeto completo do transistor foi apresentado e equipe recebeu o reconhecimento pelo trabalho e pelos talentos individuais. A imprensa cobriu o evento, destacando-o como uma inovação importante.

 

As fotos promocionais da descoberta deram destaque a Shockley, que apareceu sentado na cadeira de Brattain, junto ao microscópio dele, dando a impressão de que Shockley havia realizado o trabalho ali.

 

Por causa disso, houve tensões na equipe, especialmente entre Shockley e seus colegas. Bardeen acabou saindo para assumir um cargo em uma universidade.

 

Shockley queria abrir uma empresa. No entanto, ele foi convencido, por Beckman, um industrial conhecido, a liderar uma divisão nova da Beckley Instruments, que ele criaria para realizar pesquisas sobre transistores.

 

Shockley aceitou e logo tentou contratar colegas seus que tinham trabalhado nos Laboratórios Bell.

 

 

Noyce e Moore


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 Fig. 2 – Noyce (esquerda) e Moore.

 

Os dois contratados mais notáveis foram Robert Noyce, que tinha doutorado no MIT e Gordon Moore, um químico.

 

Shockley foi convencido a instalar a nova divisão em Palo Alto, na Califórnia, por Fred Terman, um doutorando aluno de Vannevar Bush, insistindo que ali seria o lugar ideal para a empresa dele. Era o silício indo para o vale de Palo Alto, que depois seria chamado de Vale do Silício.

 

Terman tinha criado um parque industrial em um terreno não utilizado pela Universidade de Stanford e o oferecia a empresas de tecnologia, que podiam arrendar terrenos a preço baixo e construir novas instalações.

 

Era uma espécie de Parque Tecnológico e Terman dizia que a proximidade das empresas com a universidade seria benéfica a todos. Hewlett e Packard tinham sido alunos de Terman, que também os convenceu a se instalar em Palo Alto, sendo a HP a primeira empresa ir para lá.

 

Após algum tempo de trabalho em Palo Alto, na nova divisão da Beckman, Shockley já tinha feito inimizades com sua equipe. Seu chefe, Beckman, tentou apaziguar os ânimos, mas diversos talentos da empresa já tinham decidido sair.

 

Oito dos principais talentos (conhecidos como “os 8 traidores”), entre eles, Noyce e Moore, decidiram sair e fundar uma nova empresa. Eles falaram com Sherman Fairchild, empresário que aceitou financiar a empresa, que se chamou Fairchild Semiconductor, localizada perto de Palo Alto.

 

Shockley, afinal, criou sua empresa, a Shockley Semiconductor Laboratory, que nunca deu certo.

 

Nesta época, os russos lançaram o satélite Sputnik, impulsionando a corrida espacial e aumentando a demanda por transistores e pela tecnologia de semicondutores.

 

A Fairchild Semiconductor se aproveitou da ascensão da indústria de tecnologia em Palo Alto, prosperando e se tornando um dos pilares da revolução tecnológica que moldou o mundo moderno.

  


Haggerty e Teal


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Fig. 3 – Haggerty (esquerda) e Teal.

  

Patrick (“Pat”) Eugene Haggerty era um engenheiro americano, executivo da Texas Instruments, Gordon Teal era um pesquisador químico, que havia trabalhado nos Laboratórios Bell.

 

Haggerty viu o potencial comercial do transistor e contratou Teal, especialista em trabalhar com germânio, mas passou a trabalhar para produzir o transistor de silício, mais abundante e que seria mais barato também. Teal descobriu que o transistor de silício era muito mais imune a temperaturas altas do que o de germânio.

 

Logo, Haggerty começou a produzir transistores a um custo muito mais baixo do que a concorrência. Ele tentou convencer fabricantes de rádio a fabricarem rum rádio de bolso, mas recebia a resposta de que o povo não queria isso.

 

Afinal, Haggerty convenceu uma pequena empresa, que fabricava circuitos de antenas de TV, a produzir um rádio de bolso, que seria chamado de Regency TR-1.

 

O Regency se tornou o primeiro rádio transistorizado comercialmente bem-sucedido. Diferentemente dos rádios que ficavam nas salas das casas, ele era bem pequeno e usava apenas 4 transístores.

 

O Regency permitiu uma nova forma de entretenimento pessoal e revolucionou a tecnologia.

 

Este rádio impulsionou a produção em massa do transistor, que o tornou muito barato e passou a ser usado em diversos aparelhos eletrônicos, marcando o início de uma nova era na eletrônica pessoal.

 

Como Steve Jobs fez no futuro, Haggerty criou um aparelho que os consumidores ainda não sabiam que precisavam, mas logo o considerariam indispensável.

 

Usando como exemplo o rádio Regency, o diretor da IBM, Thomas Watson Jr., pediu a seus executivos que tomassem e passassem a usar transístores nos seus computadores da empresa.

 

O rádio transístor foi o primeiro exemplo importante da tecnologia produzindo aparelhos de uso pessoal, tema importante da era digital!

 

 Kilby, Hoerni e Grove

 

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 Fig. 4 – Kilby (esquerda), Hoerni (centro) e Grove (direita).

 

 Jack Kilby era um físico e engenheiro eletricista americano, Jean Hoerni era físico e matemático suíço, Andy Grove era engenheiro químico e empresário americano.

 

Kilby trabalhava na Texas Instruments e tinha muito conhecimento e experiência em eletrônica.

 

Ele sabia que poderia criar um resistor partir de um pouco de silício sem impurezas, bem como sabia uma forma de armazenar uma pequena carga elétrica no silício, que funcionaria como um capacitor.

 

Na verdade, ele sabia que poderia fabricar qualquer componente eletrônico usando o silício de maneiras diferentes. Disso tudo, ele teve a ideia de fazer vários componentes em uma única peça de silício, eliminando a necessidade de soldar componentes em uma placa de circuito.

 

Ele integrou vários componentes em uma peça monolítica de silício e criou o primeiro microchip, ou circuito integrado.

 

No entanto, seu dispositivo ainda tinha uma montagem desajeitada, não sendo prático para produção em massa. Mesmo assim, a Texas requereu sua patente, o chamou de Circuito Sólido (“solid circuit”) e, semanas depois, anunciou a invenção como a mais importante depois do transistor.

 

Por outro lado, Noyce e sua equipe na Fairchild Semiconductor estavam tendo problemas com os seus transistores, que falhavam na presença de um minúsculo grão de poeira ou de alguns gases.

 

Jean Hoerni, um físico da Fairchild (e um dos 8 traidores), desenvolveu um processo que consistia em aplicar uma fina camada de óxido de silício sobre a superfície do silício para protegê-lo, que eles chamaram de chamado de processo planar (“the planar process”). Depois, foram abertas minúsculas janelas no óxido para as impurezas passarem, em pontos precisos. Funcionou e virou um transistor confiável!

 

Logo pensaram em requerer patentes para este transistor. Foi quando Noyce teve a ideia de usar fios de cobre impressos na placa de silício e colocar vários transistores numa mesma placa, conectados pelos fios impressos, os fios físicos entre os circuitos de transistores poderiam ser eliminados. Era outra ideia para um microchip.

 

Poucos meses depois de Kilby, Noyce teve a sua ideia de um microchip, independentemente, e cada um tinha seguido um caminho diferente.

 

O processo planar, da Fairchild, que permitia a fabricação eficiente de chips integrados usando silício e óxido de silício resolveu os problemas de confiabilidade e praticidade relacionados aos chips da Texas, tornando-os adequados para produção em massa.

 

A Fairchild Instruments requereu a patente e é claro que houve uma briga judicial com a Texas Instruments pela patente do microchip.

 

Kilby e Noyce foram reconhecidos como coinventores do microchip, mas a disputa legal sobre as patentes dos processos de fabricação continuou por vários anos.

 

Quando os microchips estavam vendendo de maneira vertiginosa, Moore fez um prognóstico do mercado futuro para eles, com uma previsão muito otimista para os 10 anos seguintes. Ele disse que o número de transistores que podiam ser colocados em um único microchip, de forma rentável, duplicaria a cada ano.

 

Mais tarde, ele atualizou a duplicação para cada dois anos. Esta previsão ficou conhecida como a “Lei de Moore”. Posteriomente, um colega seu a atualizou para a cada 18 meses.

 

A Fairchild Semiconductor, onde Noyce e Moore trabalhavam anteriormente, enfrentou desafios internos e discordâncias que levaram alguns de seus talentos a se desligarem e fundarem novas empresas, contribuindo para o crescimento do Vale do Silício.

 

Quando Noyce e Moore decidiram deixar a Fairchild para fundar a Intel, contaram com o apoio financeiro de Arthur Rock, um importante investidor de risco que reconheceu o potencial da dupla.

 

A cultura corporativa da Intel foi moldada por Noyce e Moore, inspirada em princípios de meritocracia e liberdade criativa. Eles criaram um ambiente de trabalho aberto e flexível, incentivando a inovação e o trabalho em equipe.

 

A chegada de Andy Grove, com sua determinação e habilidades gerenciais, complementou a liderança da empresa, resultando em uma equipe executiva eficaz e equilibrada.

 

 

Hoff

 

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Fig. 5 – Hoff

 

Ted Hoff era um jovem professor de Stanford e trabalhava na Intel em projetos de chips.

 

Ele percebeu que a empresa era demandada para fabricar vários chips especializados, cada um com uma função diferente, emas com funcionamento interno bem parecido. Ele achou este método pouco rentável e imaginou, assim como Noyce e outros.

 

Quando a Intel recebeu uma demanda para fabricar 12 chips diferentes com funções especiais, mas parecidas (operar displays, cálculos, memória etc.), que iriam fazer parte de um projeto de uma calculadora de mesa potente, Hoff sugeriu que seria melhor criar um chip único que realizasse múltiplas tarefas, podendo ser programado para uma grande gama de funções. Ou seja, um único chip lógico contendo um computador com funções gerais, configurável.

 

E assim nasceu o microprocessador, criado pela Intel.

 

O primeiro microprocessador, lançado pela Intel, foi o 4004 e ele marcou o início de uma nova era na computação e na eletrônica, impulsionando o crescimento da indústria de PCs e de uma vasta gama de empresas de hardware e software.

 

Os microprocessadores começaram a ser usados em tudo: semáforos inteligentes, freios de carros, máquinas de café, geladeiras, elevadores, aparelhos médicos, relógios e milhares de equipamentos diferentes.

 

No entanto, o maior sucesso do microprocessador foi permitir a criação de computadores menores, principalmente, os computadores pessoais (PCs), que as pessoas podiam ter em suas mesas de trabalho e em casa.

 

Além disso, como a lei de Moore continuou válida, de forma que uma indústria de PCs iria se desenvolver paralelamente a uma indústria de microprocessadores.

 

Mas isso é assunto para o próximo artigo.

 

 

3 – Considerações finais

Este é mais um artigo da série DIRETO AO PONTO, que eu estou escrevendo para a DIO.

 

Desta vez, foram apresentadas pessoas inovadoras da área de hardware, tanto aqueles teóricos quanto os que tinham muita experiência prática, que revolucionaram a eletrônica e a computação, promovendo a rápida miniaturização de componentes e equipamentos, com o consequente aumento de desempenho e confiabilidade.

 

Primeiro, foi a invenção do transistor, de germânio, que substituiu as válvulas eletrônicas. Seus inventores foram Shockley, Bardeen e Brattain, que trabalhavam nos Laboratórios Bell. Inclusive, os 3 ganharam o Prêmio Nobel de Física em 1956, por pesquisas sobre semicondutores e a invenção do transístor.

 

Depois, Gordon Teal, da Texas Instruments, melhorou o transistor usando silício em lugar do germânio, elemento muito mais abundante na natureza e mais barato.

 

Aproveitando-se do pequeno tamanho e preço baixo de produção do transistor de silício, Ted Haggerty, chefe de Teal, lançou o primeiro rádio de bolso transistorizado da história, que logo virou um aparelho indispensável para todo mundo.

 

Em seguida, Kilby, também da Texas Instruments, juntou vários transistores em uma única pastilha de silício e inventou o microchip, ou circuito integrado.

 

Meses depois, Noyce, da Fairchild Instruments, também chegou ao microchip, mas seguiu uma abordagem diferente, melhorando o microchip de Kilby.

 

Kilby e Noyce foram considerados coautores do microchip, mas apenas Kilby ganhou o Prêmio Nobel de Física de 2000 pela sua invenção.  

 

Finalmente, Ted Hoff, da Intel, inventou o microprocessador, criando um circuito integrado que podia realizar inúmeras funções lógicas, sendo configurado por programação. O primeiro microprocessador lançado comercialmente foi o Intel 4004. O resto é história!

 

Nestes artigos a gente está falando de pessoas inovadoras, gente que fez toda a diferença na evolução da tecnologia que usamos atualmente.

 

Mas a evolução não se dá apenas por pessoas criativas, sendo inegável o valor que pessoas inovadoras têm quando trabalham juntas, fisicamente próximas, uma ajudando a outra a ter insights, uma puxando a outra, em estreita colaboração.

 

E isso é um dos principais resultados de instalações como os Laboratórios Bell ou da Xerox Parc, como também a proximidade entre empresas e universidades ou centros de pesquisa, como ocorreu em Palo Alto, que depois se tornou o Vale do Silício.

 

Também não podemos deixar de lembrar pessoas com espírito inovador empresarial, como Arthur Rock e Sherman Fairchild, que viram o potencial de inovadores técnicos como Shockley, Noyce, Moore e outros, e financiaram a criação de empresas como a Fairchild Instruments e a Intel.

 

Os próximos artigos tratarão de outros inovadores, que vieram após aqueles tratados neste artigo, sempre usando como referência o livro indicado a seguir.

 

 

4 – Referências

 

[1] ISAACSON, Walter. Os Inovadores – Uma biografia da revolução digital. Companhia das Letras, 2014.

 

 

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