Scrum na educação: o case eduScrum no Ashram College
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Scrum na educação: o case eduScrum no Ashram College
1. Contexto do case
No livro “Scrum: a arte de fazer o dobro do trabalho na metade do tempo”, Jeff Sutherland descreve como o Scrum começou a ser usado fora da TI, inclusive em escolas. Um dos exemplos mais marcantes é o do Ashram College, uma escola pública de ensino médio em Alphen aan den Rijn, na Holanda, com cerca de 1.800 estudantes.
Nessa escola, o professor de Química e Física Willy Wijnands passou a aplicar Scrum em sala de aula, dando origem ao que hoje é conhecido como eduScrum, uma adaptação educacional do framework.
Com o eduScrum, os alunos são divididos em times de quatro estudantes, trabalham com um backlog de aprendizagem, usam um quadro visual na parede (com tarefas “a fazer”, “em andamento” e “concluídas”) e organizam o estudo em sprints, ao final dos quais há provas, apresentações ou entregas de trabalhos.
Relatos tanto de Sutherland quanto de artigos acadêmicos e reportagens indicam que essa forma de trabalho trouxe melhora nas notas, maior engajamento e desenvolvimento de habilidades sociais e de trabalho em equipe.
2. Por que a abordagem ágil foi utilizada, e não a tradicional?
O problema inicial identificado pelos professores era bastante comum:
· alunos pouco engajados;
· trabalhos em grupo mal distribuídos (alguns “carregando” o time, outros quase não contribuindo);
· dificuldade de desenvolver competências como colaboração, responsabilidade e auto-organização.
A abordagem tradicional, centrada em aulas expositivas e avaliações apenas no final do período, não dava visibilidade ao esforço de cada aluno ao longo do processo nem oferecia ciclos curtos de feedback.
A abordagem ágil (via Scrum) foi escolhida porque:
· trabalha em ciclos curtos (sprints), permitindo ajustar o ritmo de estudo rapidamente;
· valoriza feedback contínuo (reviews, retrospectivas);
· incentiva auto-organização de times e responsabilidade compartilhada;
· combina bem com metodologias ativas, como Project-Based Learning.
Ou seja, a agilidade foi usada porque ensino também é um problema complexo, com muita incerteza, onde aprender/inspecionar/adaptar faz mais sentido do que planejar tudo de uma vez e só “ver o resultado” na prova final.
3. Por que especificamente Scrum?
Entre as abordagens ágeis, o Scrum se destaca por ser um framework simples, mas com eventos, papéis e artefatos bem definidos. Isso facilitou o mapeamento para o contexto escolar:
· Product Owner → professor, responsável pelos objetivos de aprendizagem e priorização do backlog.
· Scrum Master / eduScrum Master → aluno que ajuda o time a seguir o processo e remover impedimentos.
· Time → grupo de alunos responsável por atingir os objetivos da sprint.
· Backlog → lista de conteúdos, exercícios, experimentos e entregas.
· Sprint → período de algumas semanas de estudo focado em certos objetivos.
Jeff Sutherland cita o eduScrum como um dos principais exemplos de uso de Scrum fora da TI, reforçando que o framework foi pensado desde o início para ser geral, não restrito a software.
4. Como o case se enquadra nos pilares TIA do Scrum
Os pilares do Scrum são Transparência, Inspeção e Adaptação (TIA).
4.1 Transparência
No Ashram College, a transparência aparece de várias formas:
Quadro eduScrum na sala, mostrando tarefas, responsáveis e status do trabalho;
· objetivos da sprint e critérios de aceitação visíveis para todos;
· professor e alunos acompanham juntos o progresso do time.
Artigos sobre Scrum na educação destacam que gestão visual e clareza de tarefas são percebidas pelos alunos como uma das maiores vantagens do método.
4.2 Inspeção
A inspeção acontece em ciclos curtos:
· a cada aula/sessão, os times verificam o que foi feito e o que ainda falta;
· no final da sprint há avaliações (provas, apresentações, entregas) que funcionam como um “Sprint Review” do aprendizado;
· retrospectivas são usadas para inspecionar não só o resultado, mas também o processo de estudo em grupo.
Professores envolvidos com eduScrum desenvolveram instrumentos específicos de retrospectiva para adolescentes, reforçando esse pilar de inspeção constante.
4.3 Adaptação
Com base nessa inspeção frequente, o time pode se adaptar:
· mudar estratégia de estudo (divisão de tarefas, ordem dos tópicos);
· ajustar ritmo da turma;
· adaptar o próprio uso do eduScrum ao contexto (por exemplo, em disciplinas, formatos híbridos ou flipped classroom).
Relatos de implementação em universidades e escolas mostram que, após cada ciclo, os professores ajustam o desenho das sprints, o tamanho das equipes e até os artefatos usados, exatamente como o Scrum propõe.
5. Como o case se conecta aos valores do Scrum
Os valores do Scrum, também reforçados na apresentação da DIO, são: Compromisso, Foco, Abertura, Respeito e Coragem.
Estudos sobre Scrum em educação apontam esses mesmos valores como benefícios diretos para times de alunos.
Compromisso:
Os times são co-responsáveis por atingir os objetivos de aprendizagem definidos para a sprint. Em eduScrum, o resultado “produto” é o próprio conhecimento adquirido pelo time, não apenas a nota individual. Isso estimula que todos assumam compromisso com o grupo.
Foco:
Com um backlog priorizado e objetivos claros por sprint, os estudantes sabem exatamente em que concentrar energia naquele ciclo, evitando dispersão com muitos assuntos ao mesmo tempo.
Abertura:
Reuniões frequentes e retrospectivas estimulam que os alunos falem de dificuldades, conflitos de time e dúvidas sobre o conteúdo. A transparência do quadro também facilita conversas honestas sobre quem está sobrecarregado ou precisando de ajuda.
Respeito:
No relato do eduScrum, professores destacam que alunos mais “quietos” passam a ter seu trabalho reconhecido, e as equipes são formadas considerando qualidades complementares, o que aumenta o respeito pelas diferenças dentro do time.
Coragem:
Aplicar Scrum em uma escola tradicional já exige coragem dos professores. Para os estudantes, há coragem em assumir responsabilidade, expor erros nas retrospectivas, experimentar novas formas de aprender e apresentar resultados em público.
6. O resultado final era inovador? Por quê?
Sim, o resultado pode ser considerado inovador em vários sentidos:
· leva um framework de gestão de projetos (Scrum) para um contexto não óbvio (ensino médio);
· transforma a aula de uma experiência passiva (professor falando, aluno ouvindo) em uma experiência ativa e colaborativa;
· evidências indicam melhora nas notas, maior motivação e desenvolvimento de soft skills como colaboração, comunicação e pensamento crítico.
Além disso, esse case serviu como base para disseminar o eduScrum em outras escolas e universidades, mostrando que práticas ágeis podem ser uma forma concreta de implementar educação centrada no aluno.
7. O que eu faria diferente (análise crítica pessoal)
Apesar dos resultados positivos, há pontos que merecem reflexão crítica:
Risco de “Scrum de fachada”
Se a escola só copiar quadros e cerimônias sem trabalhar profundamente pilares e valores, o método vira só mais uma burocracia visual. Eu reforçaria formações específicas sobre valores ágeis para professores e alunos, não apenas sobre eventos.
Equilíbrio entre processo e conteúdo
Existe o risco de gastar tempo demais na gestão do processo (boards, reuniões, papéis) e de menos no estudo profundo do conteúdo. Uma melhoria seria definir métricas de aprendizagem (competências, habilidades) além das notas, para garantir que o foco não desvie.
Desigualdade de competências dentro dos times
Estudos mostram que, mesmo com Scrum, alguns alunos podem continuar contribuindo menos.
Eu incluiria mecanismos formais de autoavaliação e avaliação por pares dentro da retrospectiva, para trazer visibilidade e correção para esse tipo de desequilíbrio.
Adaptação a contextos digitais/remotos
Muitos relatos ainda focam em ambientes presenciais. Casos mais recentes, como o uso de eduScrum em ambientes híbridos e flipped classroom, já existem, mas ainda são pouco explorados.
Eu exploraria mais ferramentas digitais (quadros online, métricas automáticas) para manter TIA mesmo fora da sala física.
8. Conclusão
O case do eduScrum no Ashram College mostra que o Scrum pode ser aplicado com sucesso fora da TI, mantendo fielmente seus pilares (Transparência, Inspeção, Adaptação) e valores (Compromisso, Foco, Abertura, Respeito, Coragem) em um contexto complexo como a educação.
Ao transformar estudantes em times auto-organizados, tornar o aprendizado transparente e iterativo e incorporar feedback contínuo, o eduScrum aproxima a escola da realidade do trabalho moderno e do espírito ágil. Ao mesmo tempo, o case abre espaço para críticas e melhorias – exatamente como um bom time Scrum faria a cada sprint.



