O pensamento Lean e o paradoxo de Zenão: por que melhorar sempre parece infinito?
Você já teve a sensação de que, por mais que sua equipe melhore processos, produtos ou métricas, sempre há algo a ser otimizado? Como se a linha de chegada estivesse sempre um passo à frente?
Zenão de Eleia, filósofo grego do século V a.C., formulou uma série de paradoxos que desafiavam as noções tradicionais de movimento e continuidade. Um dos mais conhecidos é o paradoxo de Aquiles e a tartaruga, que sugere que, se uma tartaruga estiver à frente de Aquiles em uma corrida, este jamais a alcançará, pois precisará sempre percorrer metade da distância restante, num ciclo sem fim. A conclusão? O movimento, sob essa lógica, pareceria impossível, porque jamais se completaria.
Embora soe como um exercício filosófico distante, esse paradoxo diz muito sobre nossa vivência em ambientes Lean e ágeis. Será que, ao buscar constantemente melhorias, estamos perseguindo um fim que nunca chega?
O pensamento Lean, consolidado por nomes como Taiichi Ohno e James Womack, é guiado pelo princípio da melhoria contínua — o famoso Kaizen. Mas ao contrário do que muitos pensam, o Lean não busca a perfeição como um ponto final, e sim como uma direção. A “perfeição” no Lean é, por definição, inatingível. E isso é proposital: manter-se em movimento é mais importante do que alcançar um fim.
Aqui, o paradoxo de Zenão ganha nova luz. Cada melhoria é um passo rumo a um estado “melhor” — mas sempre haverá novas dores, gargalos, ajustes e aprendizados. Em times de tecnologia, essa sensação de “nunca terminar” pode ser desgastante, sobretudo em culturas obcecadas por eficiência, resultados e entregas contínuas.
No desenvolvimento de produtos digitais, não há fim definido. A cada sprint, entregamos valor — mas o backlog nunca fica vazio. Novas tecnologias surgem, bugs aparecem, o comportamento do usuário muda. O que hoje é “ótimo”, amanhã pode ser obsoleto. “Produto final” é uma ilusão; o que temos são versões progressivamente melhores.
Perseguir o “produto perfeito” é correr atrás de um alvo em movimento. E talvez a chave esteja em aceitar que esse alvo nunca para — e tudo bem.
Se a melhoria é infinita, que seja também inspiradora. Equipes maduras não enxergam a perfeição como um destino, mas como uma prática contínua. O foco se desloca: não é sobre chegar, mas sobre evoluir a cada ciclo.
Essa filosofia se alinha a princípios estoicos: foque no que você pode melhorar agora, aceite que o caminho é constante e que o controle está mais no processo do que no resultado.
Por que melhorar sempre parece infinito? Porque é mesmo. Mas essa não é uma falha no sistema — é justamente o que impulsiona a inovação e o crescimento.
Melhorar sempre parecerá infinito porque a excelência não é um ponto fixo, é um hábito. Como disse Aristóteles, “somos o que repetidamente fazemos. Excelência, então, não é um ato, mas um hábito.”
Que tal, então, enxergar o paradoxo de Zenão não como obstáculo, mas como um lembrete de que sempre há espaço para crescer — e isso é uma boa notícia.
Arthur Gomes Soares